quarta-feira, 1 de março de 2023

I Fly among the stars.

 Fazia tempo que não escrevia.


Passei muitos anos na busca de algo que, no fundo, eu não sabia se iria encontrar.

Escrever era uma forma de me localizar no caminho. Não como uma bússola, que me diria para onde ir, mas como um ponto de referência, que me dizia onde eu estava. Mas ao mesmo tempo, era doloroso e difícil. 

Para escrever, eu precisava entrar em contato comigo. Descer desse carrossel que é minha mente, e me olhar - primeiro, de perto; depois, à distância.

Observar a mim mesma é uma tarefa extremamente difícil pra mim. Eu sempre tive uma visão completamente deturpada de quem eu sou. Muito crítica, depreciativa, exigente. 

O que vejo no espelho é um monstro amorfo, pesado, repugnante. Essa é a imagem que encontro quando olho minhas formas. Mas a pior parte são os olhos. O que vejo em meus olhos é a transliteração, em personalidade, do que vejo concretamente.

Eu vejo angústia, fracasso, súplica, cansaço. Vejo uma alma que não sabe onde está, para onde vai, ou o que está fazendo. Uma alma perdida, fora de controle, fora do eixo. Sem luz, sem brilho. Sem propósito. Sem vontade.

Desvio o olhar do espelho, e olho ao redor.

 (Quase) tudo o que eu havia sonhado um dia está aqui. Até mais do que imaginava conquistar.

É incoerente. Não consigo conectar o que vejo ao redor e o que vejo no espelho. Esse monstro sem vida não poderia ter chegado tão longe. Esse monstro não merece tanto. Não faz sentido.

Eu sei, em meu consciente, que a lógica não falha. Causa e consequência. Se eu tenho tudo isso, foi a colheita de um plantio árduo e persistente. 

Eu sei. Mas não sinto.

O que eu semeei, afinal?

Ah sim, eu semeei. Muito. Mas nas hortas alheias.
Fui, para os outros, o meu melhor. Fui aquilo que gostaria de ser comigo mesma.

Meu único arrependimento foi ter deixado minha horta vazia.

 

Acho que é isso que busco afinal. Construir meu próprio pomar.

Talvez ali, sentindo uma brisa fresca com cheiro de terra molhada, na sombra de um tamarindeiro, à beira de um lago, eu consiga ver minha imagem refletida, e enxergar com outros olhos.

Enxergar outros olhos.