quinta-feira, 25 de julho de 2013

6.

Tocava blues bem baixinho no quarto. Lá fora, frio e vento. Aqui dentro - dentro de mim - havia uma calma morna, uma paz aconchegante.

Você estava aqui, ao meu lado. Era o que bastava para que tudo se aquietasse, para que minha mente interrompesse o processo criativo-pessimista em que esteve nos últimos dias. Era tudo o que eu precisava para deixar as coisas no eixo, voltar ao meu estado natural.
Ali, olhando para você, eu me sentia completa.

Então, todas as perspetivas de futuro que um dia eu já tive naufragaram naquela sensação de plenitude. Você veio, me mostrando novas possibilidades, outras opções. Veio para me provar que eu posso sim ser feliz, apesar de tudo.

E em algum lugar entre meu sono REM e o calor da cama, eu flutuava na certeza de que era aquilo que eu sempre quis pra mim, mas nunca pude acreditar que esse dia chegaria. Estava eu ali, resoluta de que era apenas mais um sonho lúcido. Mas sua pele, seu perfume, sua mão no meu rosto, seus pés enroscados nos meus... Tudo indicava que era real.
Era verdade, você estava ali. Por mim.

Não posso dizer que dormi bem. Por várias vezes acordei, pra ver se você estava descoberto, para ter certeza de que não estava te empurrando pra fora da cama. Pra convencer meu cérebro de que você estava ali. Mas acordaria por mais cem vezes se preciso fosse, desde que tudo estivesse bom pra você.

Mas tudo passou. As horas voaram. Como sempre, o tempo teima em arrastar enquanto eu te espero, e simplesmente corre quando você está aqui. E, mais cedo do que eu esperava, me deparei com a imensidão de cama e cobertas, tudo vazio, grande demais só pra mim. E o quarto parecia mais frio agora...
E, como sempre, tive que sufocar a minha vontade de que você não saísse dos meus braços porta afora.
Mas você prometeu...

"Não sai nunca daqui, fica comigo pra sempre."

quarta-feira, 3 de julho de 2013

E agora?

Eu olho no espelho, e custo me reconhecer.
Meus olhos estão escuros, meus cabelos ressecados. Meu rosto é só espinhas, meu corpo é só estrias.
Estrias e dores, dores de músculos que não aguentam mais a tensão, o peso que precisam carregar.
Minha postura já não é ereta, meus ombros estão caídos, minhas costas curvas. Meus olhos apontam pra baixo, minha cabeça pesa mais a cada dia.
Eu caminho como quem não quer caminhar, como quem precisa carregar um peso que ninguém vê. O peso da derrota, da tristeza, da vergonha.
Minhas roupas estão quase sempre amarrotadas, destoadas, deslocadas. Já não me arrumo mais, já não quero mais.

Eu olho no espelho, e recuso a me conhecer.
O que foi feito daquele olhar forte e destemido, daquele sorriso leve e determinado? Aonde foram parar a graça e a destreza, a lógica e a velocidade que caracterizavam meus pensamentos? O que aconteceu com a vontade, com a garra, com a alegria de viver cada minuto?

Eu fecho meus olhos, não quero mais ver. Mas o espelho ainda está ali, por mais que eu relute a aceitar.
Daí eu sinto. Sinto meu corpo pesado, desequilibrado. Sinto minha cabeça zunir e doer, girar e pifar. Sinto meus braços dormentes, minhas pernas sem força. Sinto tremores, calafrios. Meus órgãos não funcionam mais - meu pulmão não capta oxigênio, meus rins dormiram, meu estômago se revira com facilidade. Meu coração quase fibrila. E meu cérebro...
Ah, este é o que mais sofre.

Eu abro os olhos, tentando fugir do que encontrei aqui dentro.
Então percebo que tudo se embaça, nada mais faz sentido. Nada mais justifica estar aqui, nada mais parece capaz de mudar tudo - nem eu mesma.

Então, desesperada, eu olho para cima, para a janela.
E me pergunto:

"E agora?"